sexta-feira, 14 de maio de 2010

Penso, logo me realiza enquanto ser humano!

Será que a pedra se realiza enquanto pedra? Será que as plantas se realizam enquanto plantas? Será que os animais se realizam enquanto animais? Será que o ser humano se realiza enquanto ser humano?

No que se refere à realização de uma pedra, não muito podemos discorrer. A começar que não podemos nem dizer que ela se deixa modelar pelas intempéries do tempo. Ela não tem opção. Uma rocha que está, por exemplo, constantemente sob os impactos das ondas do mar: ela simplesmente está, independente de sua vontade, ou melhor, ela nem tem vontade, não tem vida. O fato de simplesmente estar sujeita às condições do tempo faz da pedra um ente realizado. É a forma mais simples de realização. E não é uma realização interior, consciente. Nem isso ela é capaz de experimentar. Apenas nós podemos dizer que ela se realiza, enquanto cumpre seu papel segundo a sua natureza bruta, conforme aquilo que lhe é dado a ser. Ela apenas está aí. Fico até meio receoso de dizer que ela se realiza por que para que isso acontecesse teria ela que ter consciência de suas possibilidades, no entanto, não tem. Vamos dizer então que ela apenas cumpre sempre muito bem o seu papel na natureza. Ela é aquilo que lha é dado a ser.

Passando para uma estrutura mais complexa, pensemos nas plantas. Agora já se trata de um ser vivo. Aristóteles confere já às plantas uma alma, muito elementar, mas que já torna este ser agente por si próprio. Uma pedra não se desenvolve. No entanto um ser constituído desta Elemental forma vital já tem capacidade para fecundar, germinar, alimentar-se, crescer, reproduzir, envelhecer e morrer. Esta alma, chamada pelo filósofo de vegetativa, se encarrega de realizar o ser da planta. Como assim realizar? Podemos responder esta pergunta respondendo antes a esta outra: qual é o papel de uma planta na natureza? É vegetar! É simplesmente agir como alguém que está em estado vegetativo. Desempenhar suas funções biológicas apenas. Não é um ser consciente e deixa-se apenas conduzir pelas determinações naturais de sua respectiva espécie. Desta forma podemos também dizer que a planta se realiza enquanto cumpre com todas as possibilidades que lhe são dadas pela sua natureza, pela sua alma vegetativa.

Num animal, além da alma vegetativa, responsável pelos processos biológicos de sua organicidade corpórea, parece existir algo a mais do que isso. Percebemos que um animal, diferentemente de uma planta, pode se locomover, pode agir, pode sentir dor e prazer. Já é um ser muito mais complexo que as plantas. O que lhe possibilita tudo isso, é o que Aristóteles chamou de alma sensitiva. Um animal, além de cumprir com as possibilidades de seu desenvolvimento biológico (alma vegetativa), cumpre também com as possibilidades sensitivas. Ele as realiza plenamente. Nasce, cresce, se reproduz, envelhece e morre (condições oferecidas pela sua alma vegetativa), e sente dor, sente prazer, sente sabor, vê, cheira, sente calor e frio, confia e desconfia (alma sensitiva). Enfim, um animal se realiza enquanto cumpre com todas as possibilidades que lhe são dadas pela sua natureza, pela sua alma vegetativa e sensitiva.

E o ser humano se realiza enquanto ser humano? O que podemos dizer do ser humano quando fazendo uma análise do que ele se mostra na realidade? O ser humano cumpre com todas as suas possibilidades naturais? Vejamos. É evidente que o indivíduo humano nasce, cresce, se reproduz, envelhece e morre. Isso também faz uma planta e um animal. É evidente que um indivíduo humano se locomova, sinta calor ou frio, sinta dor ou prazer, amor ou ódio, sinta sabores e cheiros, vê, escuta. Isso também pode fazer um animal. Desempenhando todas essas funções, comuns também aos animais, pode o ser humano, desta forma, se realizar enquanto tal? Evidentemente que não. O ser humano foi presenteado com muitas outras possibilidades que lhe são exclusivas mediante a sua racionalidade, o seu pensar. O homem é portanto, um ser provido das almas responsáveis pelo seu desenvolvimento biológico (alma vegetativa), pelos seus sentidos (alma sensitiva), e pela sua capacidade de reflexão (alma intelectiva). Parece-nos que muitas pessoas não consideram sua característica propriamente humana de poder refletir sobre o mundo, e deixam-se guiar mais por suas paixões, emoções, instintos e desejos do que pela razão. Corremos o risco de colocarmo-nos no nível dos animais e “curtir” a vida na sua forma biológica e sensitiva, desconsiderando que a plena realização do ser humano está diretamente relacionada também à sua racionalidade. Porque que não nos esforçamos por viver como seres humanos e nos contentamos com nossas paixões? Por que será que nos satisfazemos em viver no nível dos animais enquanto estes não se satisfazem em viver como as plantas?

Sei lá. Só sei que isso confere. Esses dias mesmo uma senhora me questionava. Dizia ela: “ahhh você tem que ser feliz!!” Aí eu perguntei qual era a sua concepção de felicidade e ela me disse: “ah é ‘TUDO’!” Poxa, que resposta convincente. Quis saber mais sobre esse “tudo” que ela se referiu e escaparam-lhe de sua boca as palavras “sexo”, “beber”, “comer”, “dinheiro”. Ou seja, felicidade = tudo = sexo + comida e bebida + dinheiro. Bem humano não? Seguindo o raciocínio dela, ser feliz é fazer “tudo” isso, não passar do nível animal. Nem sequer mencionou o fato de “pensar” como algo que possa realizar o ser humano enquanto tal. Enfim, recebemos um presente, o qual temos preguiça de utilizar. E essa preguiça nos impede de nos realizarmos plenamente, isto é, de aproveitar tudo aquilo que somos capazes de fazer: desenvolver, sentir e raciocinar.

2 comentários:

  1. Muito bem. Concordo plenamente. Vale salientar que as coisas estão mudando com o tempo e na minha opinião para melhor. Um exemplo é o caso das mulheres. Antigamente para elas ser feliz era apenas ter um bom marido e criar seus filhos. Hoje já estão completamente inseridas no mercado de trabalho. Acredito que a globalização e as facilidades tecnológicas deveriam ser um rol de entrada para o conhecimento, como a internet. Mas voltamos a estaca zero novamente com MSN, ORKUT, FACEBOOK, dentre outras coisas que tanto tomam o tempo das pessoas com futilidades. Acredito que deveria existir uma mescla na educação dos filhos entre PAIS X PROFESSORES. Ou seja, mais investimento do governo em educação e mais interesse dos pais em ensinar coisas novas para os filhos, principalmente a aproveitar tudo aquilo que você citou e muito bem citado acima: Desenvolver, sentir e raciocinar. Se ainda estamos anos luz atrás de potências mundiais como Japão e E.U.A, muito se deve a educação. Pais que vão do trabalho para casa, em casa na televisão (Big Brother) e com isso os filhos acompanhando a maravilhosa maneira de viver.

    Bom, o assunto é muito extenso. Fico por aqui meu amigo Reginaldo. Um grande abraço!

    Fernando da Cruz

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  2. Perdão pelo erro grosseiro. A frase correta seria " Para elas serem felizes bastava ter um bom marido..." Obrigado.

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